quarta-feira, 6 de abril de 2011

Comparato e a OEA: STF e PGR estão condenados moralmente

E AGORA, BRASIL?


Fábio Konder Comparato


A Corte Interamericana de Direitos Humanos acaba de decidir que o Brasil descumpriu duas vezes a Convenção Americana de Direitos Humanos. Em primeiro lugar, por não haver processado e julgado os autores dos crimes de homicídio e ocultação de cadáver de mais 60 pessoas, na chamada Guerrilha do Araguaia. Em segundo lugar, pelo fato de o nosso Supremo Tribunal Federal haver interpretado a lei de anistia de 1979 como tendo apagado os crimes de homicídio, tortura e estupro de oponentes políticos, a maior parte deles quando já presos pelas autoridades policiais e militares.

O Estado brasileiro foi, em conseqüência, condenado a indenizar os familiares dos mortos e desaparecidos.

Além dessa condenação jurídica explícita, porém, o acórdão da Corte Interamericana de Direitos Humanos contém uma condenação moral implícita.

Com efeito, responsáveis morais por essa condenação judicial, ignominiosa para o país, foram os grupos oligárquicos que dominam a vida nacional, notadamente os empresários que apoiaram o golpe de Estado de 1964 e financiaram a articulação do sistema repressivo durante duas décadas. Foram também eles que, controlando os grandes veículos de imprensa, rádio e televisão do país, manifestaram-se a favor da anistia aos assassinos, torturadores e estupradores do regime militar. O próprio autor destas linhas, quando ousou criticar um editorial da Folha de S.Paulo, por haver afirmado que a nossa ditadura fora uma “ditabranda”, foi impunemente qualificado de “cínico e mentiroso” pelo diretor de redação do jornal.

Mas a condenação moral do veredicto pronunciado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos atingiu também, e lamentavelmente, o atual governo federal, a começar pelo seu chefe, o presidente da República.

Explico-me. A Lei Complementar nº 73, de 1993, que regulamenta a Advocacia-Geral da União, determina, em seu art. 3º, § 1º, que o Advogado-Geral da União é “submetido à direta, pessoal e imediata supervisão” do presidente da República. Pois bem, o presidente Lula deu instruções diretas, pessoais e imediatas ao então Advogado-Geral da União, hoje Ministro do Supremo Tribunal Federal, para se pronunciar contra a demanda ajuizada pela OAB junto ao Supremo Tribunal Federal (argüição de descumprimento de preceito fundamental nº 153), no sentido de interpretar a lei de anistia de 1979, como não abrangente dos crimes comuns cometidos pelos agentes públicos, policiais e militares, contra os oponentes políticos ao regime militar.

Mas a condenação moral vai ainda mais além. Ela atinge, em cheio, o Supremo Tribunal Federal e a Procuradoria-Geral da República, que se pronunciaram claramente contra o sistema internacional de direitos humanos, ao qual o Brasil deve submeter-se.

E agora, Brasil?

Bem, antes de mais nada, é preciso dizer que se o nosso país não acatar a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, ele ficará como um Estado fora-da-lei no plano internacional.

E como acatar essa decisão condenatória?

Não basta pagar as indenizações determinadas pelo acórdão. É indispensável dar cumprimento ao art. 37, § 6º da Constituição Federal, que obriga o Estado, quando condenado a indenizar alguém por culpa de agente público, a promover de imediato uma ação regressiva contra o causador do dano. E isto, pela boa e simples razão de que toda indenização paga pelo Estado provém de recursos públicos, vale dizer, é feita com dinheiro do povo.

É preciso, também, tal como fizeram todos os países do Cone Sul da América Latina, resolver o problema da anistia mal concedida. Nesse particular, o futuro governo federal poderia utilizar-se do projeto de lei apresentado pela Deputada Luciana Genro à Câmara dos Deputados, dando à Lei nº 6.683 a interpretação que o Supremo Tribunal Federal recusou-se a dar: ou seja, excluindo da anistia os assassinos e  torturadores de presos políticos. Tradicionalmente, a interpretação autêntica de uma lei é dada pelo próprio Poder Legislativo.

Mas, sobretudo, o que falta e sempre faltou neste país, é abrir de par em par, às novas gerações, as portas do nosso porão histórico, onde escondemos todos os horrores cometidos impunemente pelas nossas classes dirigentes; a começar pela escravidão, durante mais de três séculos, de milhões de africanos e afrodescendentes.

Viva o Povo Brasileiro!

2 comentários:

  1. A "Comissão Interamericana de Direitos Humanos" da OEA não passa de um órgão insignificante pertencente a uma instituição insignificante. O engraçado de toda essa história é que a esquerda só se mobiliza a favor dos direitos humanos quando os autores de pretensos crimes são agentes de regimes de direita! Não se escuta uma única palavra de protesto contra os crimes cometidos pelas mais terríveis tiranias do século XX, tais como as de Stalin, Mao Zedong, Pol Pot e Fidel Castro, responsáveis por mais de 100 MILHÕES DE VÍTIMAS INOCENTES! A esquerda latino-americana é HIPÓCRITA E FALSA!

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  2. Quando se faz oposição a governo de "direita", é exercício da democracia. Quando se faz oposição a governo de "esquerda", é "golpismo".
    Se crimes são cometidos por agentes de governos de "direita", devem ser julgados, condenados e punidos. Se esses crimes são cometidos por militantes de organizações terroristas de esquerda, eles devem ser anistiados, indenizados e tratados como "heróis".
    Se a imprensa denuncia falcatruas de governos de "direita", ela está exercendo plenamente seu direito a liberdade de expressão e cumprindo seu papel social e cidadão. Agora, se imprensa denuncia falcatruas de governos de "esquerda", ela está sendo "golpista", "direitista" e defende os interesses dos "poderosos" e das "oligarquias", devendo ser por isso "controlada".
    Oposição à governo de "direita" é adversária política. Oposição à governo de "esquerda" é "inimiga do povo" e deve ser "aniquilada".
    TRISTE TEMPO ESTE NOSSO! A ESQUERDA AINDA NÃO APRENDEU A LIÇÃO DA HISTÓRIA!

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